23 de dezembro de 2013

Dezembro

Rosa branca
Vento forte
Arranca as suas pétalas
Arrasta o seu cheiro
Para além do jardim

É dezembro
E o tempo
Arranca as folhas do calendário
Os dias
Os meses passados
Se decompoem na memória
E se transformam em histórias
Que o vento arrasta para além dos anos

É dezembro
Tudo findo
Uma rosa fenece
Enquanto outra desabrocha
Para o ano que vem vindo...


Anderson Lopes

26 de novembro de 2013


Chorei
Como há muito não chorava
Até que não restou mais uma gota de lágrima
No rio de minhas lamentações
Chorei
Até os olhos ficarem secos
E a alma enxuta.


Anderson Lopes




[imagem: internet]

12 de novembro de 2013

Noite Calma


Noite calma
O vento desliza as suas mãos em meus cabelos
E a paz envolve o meu corpo inteiro
Como a asa da mãe ave envolve o filhote descoberto
Como o útero a proteger o feto
E eu entro em contato com um novo universo

A noite me gera numa gestação tranqüila
"E quando o sol dilatar dará luz"
A uma nova vida...

Anderson Lopes

26 de outubro de 2013

Agridoce

Mar que naveguei
Muito do teu sal em mim ainda resta
Muito do teu sal em mim ainda pesa
Também muito de mim em ti ainda há

Por mais que eu me afogue em águas doces
Águas escuras de rios profundos
De mim o teu sal não sai
Mistura-se ao açúcar que há em mim agora
E eu caminho agridoce por esta vida
De sabor indefinido...

Anderson Lopes

12 de outubro de 2013

"Doce de Outublo"


Menino sem mãe
Nascido da dor do acaso
Jogado no mundo para sentir
As dores do ser invisível.


***

"Dia doce de outublo!"
Dizia a criança
Inconsciente de sua realidade amarga...


(Anderson Lopes)

2 de outubro de 2013

Seca




Ah, chuva
Minha existência foi pura seca
Esperei por ti tantos verões

Ah, doce chuva
Molha e fertiliza
O terreno árido de minhas emoções...


***


Chuva bem-vinda
Reacende a vida
Nos campos de mim.


(Anderson Lopes)

28 de agosto de 2013

Bom Dia e Adeus

Bom dia e adeus
A tudo o que não somos
E bem que nós tentamos
Seguir as regras do amor padrão

Depois de mais uma noite de desencontros
Não cabe mais tanto fingimento
Pecamos pela ausência se sentimentos
Inevitável foi o desencanto

Bom dia e adeus
A tudo o que evitamos
A tudo o que inventamos
Para manter as aparências do amor ilusão.

Anderson Lopes

14 de agosto de 2013

No Coração Dessa Mulher


O amor voltou a fazer coisas
No coração dessa mulher
Ela agora anda faceira
Com brilhantes se enfeita
Sua alma dança balé

Envolta no abraço
Do ser amado
Nem sente as dores da idade
Nem sente a tristeza de ainda existir

Reencontrou a mocidade
E toda a vontade
De se gastar na vida
Antes do tempo decretar o seu fim.

Anderson Lopes

26 de julho de 2013

Canção de Inverno



O frio chegou tomando acento
Deixando tudo mais evidente
A dor
A saudade
Os medos da gente
E a solidão dos carentes

O agasalho
A fogueira
A água quente
E a má condição dos indigentes

O olhar
O paladar
O cheiro da flor
Uma canção de amor
Que de repente
Toca e torna tudo mais atraente...

(Anderson Lopes)

11 de julho de 2013

Bruna


Quanta dor há naquela menina
Tão nova ainda
E a tristeza já fez morada
A vida pesa
Naquelas mãos delicadas

Amores já viveu
Com a experiência de mulher já feita
Amores já perdeu
Já derramou prantos de viúva aflita
A pele muito jovem
Reveste a alma envelhecida

E quanta alma há naquela menina
Transborda em seu corpo
Como o mar que a praia invade
E arranca o cais em noite de tempestade
Com a mesma força que tem a saudade
Em seu peito ainda em formação.

Anderson Lopes

29 de junho de 2013

O Perdão

O tempo lava o chão
Onde o ódio derramou o seu sangue
E o perdão faz brotar suas flores
Onde antes só nascia rancor
Livre das dores e das agruras passadas
O vento leva para longe toda mágoa cultivada
E espalha sementes de cordialidade
No terreno onde os nossos corações
Se reconciliam...

[Anderson Lopes]

11 de junho de 2013

O Amor em SP



O amor em São Paulo exige peitos fortes
E corações que suportem
Grandes distâncias
Ele é mais saudade que presença
Há que se ter paciência
Ante os sinais vermelhos
O amor em São Paulo é forasteiro
Reside no desassossego de quem ama
No desespero de quem clama
Por um pouco mais de tempo
Ao lado do ser amado
O amor em São Paulo está sempre atrasado
Mas para os apaixonados
Isso é só um detalhe.


[Anderson Lopes]

29 de maio de 2013

Um Palhaço, Um Poeta



O palhaço oculta o poeta
Pinta no rosto um sorriso
Põe nos olhos um brilho
Capaz de convencer todo o circo
De que é real a sua alegria

A alma desse palhaço é poeta
Quando sozinho
Sem tinta, sem brilho
Longe dos olhares do circo
Ele expõe na solidão o poeta
E liberta
Toda a sua poesia...


Anderson Lopes
[imagem do filme "O Palhaço", Selton Mello]

6 de maio de 2013

Só Quero de Ti



O meu corpo pequeno
Não almeja grandes espaços
Eu só quero de ti um pedaço
Um buraco tão vazio quanto eu
Para me enterrar

O meu corpo inerte
Não exige o teu movimento
Eu só quero de ti um acento
Um encosto tão parado quanto eu
Para me apoiar

O meu corpo frágil
Não anseia a eternidade
Nem vai de encontro à morte
Eu só quero de ti a verdade
Sangrando intensamente em meu corpo
Como um profundo corte.

[Anderson Lopes]

15 de abril de 2013

Leve-me




Perca-se em meu coração
Ele é um mundo a desbravar dentro de mim
Ele é um mar para você mergulhar
E nas profundezas me encontrar
Já perdendo o fôlego
Perca-se em meu coração
E leve-me para a saída
Leve-me de volta à vida.

Dance ao som do meu coração
Que ele é um bumbo a batucar pra só você ouvir
Ele é um salão para você dançar
E entre passos me encontrar
Já bêbado e trôpego
Dance ao som do meu coração
E leve-me para a pista
Leve-me de volta à vida.


Anderson Lopes

2 de abril de 2013

O Meu Canto Contido



O meu canto contigo é tão contido
Como o de um pássaro tímido
Imitando as notas tristes do trompete
De um Chet Baker deprimido

É um canto sussurrado
Quase calado
Devagar e modesto
Feito o de João Gilberto

É tão contido o meu canto contigo
É um canto cansado
Como o de Gal e Caetano
Cantando domingo...

[Anderson Lopes]


5 de março de 2013

Entre o Desejo e o que Há de Fato



A intuição cega a razão
Como o olfato confunde o paladar
O gosto nem sempre faz jus ao cheiro
O sexto sentido não serve como instinto

Não sou quem desejei dez anos atrás
Tão pouco digo o que ensaiei há dez minutos antes
Os sonhos guiam a vida
E a realidade a desvia

Pintei São Paulo com olhos imaginativos
Controversa arte feita de anseios
E aspirações diluídas em tinta barata

O real desbota o quadro
Frustra o artista
Poda as suas asas

Sim, Waly
**O real é oco, coxo, capenga.
O real chapa.
A imaginação voa...


[Anderson Lopes]
** Trecho do poema "Persistência do Eu Romântico", de Waly Salomão.